sábado, 27 de setembro de 2008

Antes...

Vem, meu amor

Antes que seja tarde
Antes que tudo acabe
Antes do vazio lá de fora
Antes e bem depois de agora

Antes que o Sol ilumine
As manhãs com desgosto
Antes que haja muita luz
E nenhuma estrela no meu rosto

Antes da pontual solidão
Que chega depressa demais ao coração
Sem tempo para frio ou calor
Sem dizer se é de amizade ou de amor

Antes que a canção cale
E peçam que eu nada fale
Antes do beijo triste na fotografia
E das lágrimas inundarem meus dias

Antes do improviso na despedida
Tentando não chorar após tua partida
E de tão sozinho pela vida
Eu te considere já esquecida

Antes que a vida seja somente dor
Antes que eu desista de olhar pela porta do coração
E de te esperar com um longo sorriso de “enfim”
Antes que eu não seja tão forte
Antes dos dias
Dos meses
Dos anos...
Da morte.

Vem, meu amor
Antes do luar que outrora foste e foi
Para que na vida possa haver
Um antes
Um durante
E quem sabe, meu amor,
- Repito: quem sabe -
Um depois.

(Allan Castro)


P.S.:Com medo que a morte seja mais rápida que o amor.

#Foto.:Fábio Correia (trabalho designer)

_Paz&Bem.
__Inútil.

Introduçao Ao Poema Dos Olhos - Baden Powell

sábado, 20 de setembro de 2008

Se te nego



Se te nego
Posso não ter culpa,
Cansei de fechar os olhos
E beijar tua boca muda

Volto pra casa bem depressa,
Tão logo eu sou saudade,
Carrego um buquê de estrelas
Mas preferes o chão da cidade

Tu que sempre me encerra
Em seu breve aplauso,
Enquanto eu te ofereço
As rosas que caem sobre meu palco

Se te nego
Tenho minha razão:
Vai chegar o fim do mês
E, enfim, a solidão

Já nem ligo, pois acostumei te ver assim,
Em silêncio me negando
E quando você notar
Outra já vai está me amando

Foi pra você todo amor,
E se não era, eu inventei,
Você me segurava no solo
Mas em você eu voei

E a cama outrora tão pequena
De repente cresceu
E onde dorme teu corpo
Perderam-se os carinhos meus

Se te nego
Você se faz de morta
Deixo você com a novela
E chorando fecho a porta.
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(Allan Castro)
.
P.S.:Letra de uma canção minha com a parceria do multi-instrumentista, professor de música e meu amigão de sempre, Marcos Gomes. Depois de muitas conversas e garrafas de vinhos, resolvemos levar a sério nosso projeto musical. Em breve, se tudo correr bem, estaremos nos apresentando pelos bares da cidade e fora dela. Fizemos umas mini-apresentações por alguns lugares e foi muito prazeroso. Tomara que dê certo esse quarteto de mpb, ou como o tenho chamado "Quarteto Maldito". ;D
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_Paz&Bem!
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__Inútil.


Tua Imagem - Raphael Rabello

domingo, 14 de setembro de 2008

Alguém, por favor, diga a ela...

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente

(Vinicius de Moraes)



Alguém, por favor,
Diga a ela do meu sofrer
Diga o quanto penso nela
Com meu corpo e minha alma
Inclinados numa existência magoada
Onde tudo chama – tão somente – por ela
Diga que tenho medo do vento
Das distâncias, do inverno
Enfim, medo das coisas que passam
E levam algo que queríamos pela vida inteira


Diga que a menor lembrança dela
Arranca-me da cama antes do sono
E ao meu mundo desarruma no completo caos

Fale que nunca a esqueci
Por jamais tentar tirá-la de mim
Pois tenho todos os gestos e jeitos dela
Guardados na memória das minhas manhãs de sempre
Fale que vivo um feio rascunho de existência
Desde que ela se vestiu de despedida
E que enlouqueço em delírios
Tentando refazer o gosto daqueles lábios
Em bocas que não me selam a respiração
Nem tampouco me acariciam serenamente os ombros nus

Alguém, por favor,
Diga a ela que meu coração adoeceu
De tanto fantasiar o regresso
Com ela cada dia mais minha
Transfigurada e perdida em mim
De tal bruta forma que me violasse
Até os pensamentos mais secretos
E as inspirações obscenas do corpo

Diga que sinto falta e esperança
De uma maneira extraordinariamente burra
De algo que não tenho
E talvez nunca mais tenha
Porém, é dela a ausência
E aceito tê-la mesmo em forma de saudade
Peça a ela que me perdoe
Por amá-la mais do que posso
Ou do que devo amar
E de querê-la na intensidade de uma eternidade
Quando só tenho o tempo breve de uma vida

Alguém, por favor,
Diga a ela do meu desespero
Mas não fale suavemente
Fale como um ator que recita Shakespeare
Frente uma platéia barulhenta
Para que a rua ouça
Para que o bairro ouça
Para que a cidade ouça
E se puder, por favor,
Para que o mundo inteiro ouça.


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(Allan Castro)


P.S.:Para a pior e melhor coisa que aconteceu na minha vida...

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Paz&Bem.


Round Midnight - Miles Davis

sábado, 6 de setembro de 2008

Não valeu à pena, amor.

- Já sei de tudo!
Na linha, uma voz feminina, trêmula, parecia não conseguia dizer mais nada. O coração estava enorme, obstruía e esmagava as cordas vocais, calando-a...

- Já sabe de quê?
O instinto canalha normal a certos homens falara por ele querendo dar-lhe tempo de formular desculpas, enredos para alguma história digna da confiança dela, mas ele sabia a dor que desencadeara...

-Já sabe de quê? Insistiu ele. Pensou em chamá-la de “meu amor”, mas faltou-lhe mentira para isso...

Houve um silêncio curto e profundo, porém dado o instante, o silêncio pareceu longo e barulhento, no mínimo, ensurdecedor.

Céus, como grita e se arrasta o silêncio em momentos assim!

Ela flutuava descrente da dor que sentia, não sabia onde doía mais, toda ela era uma ferida mergulhada em álcool caseiro e tinha a impressão de estar numa realidade onde o amor jamais existira. No intimo, praguejou da amiga fiel que lhe contara minutos antes da festa na noite passada e dos beijos que seu amado derramou numa boca que não foi a dela. Tinha numa mão o telefone e na outra a mão da amiga colada à sua, numa firmeza de quem segura alguém que não se quer ver cair... Se existia algo que ela amava naquele momento, era aquela mão e aqueles olhos que sofriam uma dor a dois.
Amiga fiel até doer...

- Carol, me fala o que está acontecendo. É algo sério ou mais uma das suas crises de ciúmes sem razão?

Coitado dele: sentia uma culpa esmagadora dessas que faz o homem perder o rumo. Era um imbecil imaturo, fraco no amor, traíra todas as namoradas e tinha orgulho de tal proeza na rodinha de amigos, mas em alguns momentos, nesses que o homem se desfaz da sua mediocridade crônica, sentia que era bem menor que todas as mulheres de sua vida e por isso, covardemente, traía.

- Ricardo, eu sei de tudo sobre a festa. Você me... – as lágrimas interromperam as palavras, impossível tê-las ao mesmo tempo, mas ele havia entendido...

- Carol, aquilo foi... Me desculpa! Clamou.

- Espero que tenha valido a pena – Estranho, mas, ela sentiu que era sincera e que, agora, tinha pena dele.

- Não diga isso! Suplicou-lhe o infiel.
As palavras dela fizeram com que ele procurasse nas lembranças o rosto feminino da noite passada, mas lembrou-se apenas de um canto escuro e da música alta.

- Isso nunca mais vai acontecer! Disse ele com um ar de quem vai morrer. Ainda tinha esperança de salvar os noves meses que estivera junto dela.

- eu sei... Adeus – disse ela desligando o telefone.

Acabou-se o amor nela.













Ele ainda com o telefone junto da orelha vacilou e quase chorou. Quase.

“Tum... Tum... Tum” gemia o telefone solitário junto à orelha.

Um coração culpado e sozinho na linha, ainda sussurrara:
- Não valeu à pena, amor.

Tum... Tum... Tum...

(Allan Castro)

_Paz&Bem!
__Inútil.
Pieces (Piano Instrumental) - LArc~en~Ciel

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Chuva aos vinte

Ele estava muito bem sentado no banco do ônibus. Na verdade, estava quase deitado, aproveitando que no assento ao lado não havia ninguém. Olhava as casas passando ligeiras pela janela de vidro com um lado aberto, deixando uma brisa invadir seus cabelos e alma. Mantinha o ar calmo e reflexivo já tão conhecido por seus amigos e tão odiado por sua mãe, que vivia a reclamar do jeitão “bicho-grilo” do filho, aliás, pensava nela naquele momento: Como dizer que foi rejeitado em mais uma entrevista de emprego? Qual a melhor forma de fazê-la crer que, tal o filho do vizinho e outros conhecidos dela, ele também iria conseguir uma independência financeira? Não sabia! Procurou não pensar nisso num assento de ônibus, quando estivesse em casa, mais especificamente no seu quarto, seu mundo atual, pensaria nas aflições divididas com a mãe.

Depois de alguns instantes, cansou da vista na janela, puxou um livro da mochila e pôs-se a folhear; aquilo não era leitura, era mais um passatempo, uma tentativa de esquecer as palavras ditas por uma senhora com cara de bruaca, que foi bem clara quanto à incapacidade dele para exercer qualquer cargo naquela maldita empresa... Teve vontade de fazer como antigamente e passar o dia dentro dos ônibus indo de terminal em terminal, observando as pessoas nuas de fingimentos, submersas na rotina e no anonimato, mas sentia-se cansado para reviver antigas loucuras.

Lembrou-se de um tempo que ele bebia vinho e tocava violão numa roda de recém conhecidos na beira do mar. Um tempo irresponsável, vagabundo, errante e indeciso, enfim... Feliz.

Guardou o livro e as lembranças na mochila, definitivamente aquele livro não o estava fazendo bem, suas páginas deram-lhe a nostalgia, e aos vinte anos isso não é nada bom.

Pronto.

Voltou ao tempo presente onde era preciso crescer e entristecer.

Era preciso escancarar o mundo e conseguir um lugar ao Sol... Que pena... Ele queria mesmo era banhar-se na chuva.




(Allan Castro)

#Foto editada por mim! ;D

_Paz&Bem.

__Inútil.



Sete Cordas - Raphael Rabello